Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1862

Allan Kardec

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Respostas à questão dos anjos decaídos

OBSERVAÇÃO: De várias direções recebemos respostas a todas as questões apresentadas no número de janeiro último. Sua extensão não permite a publicação simultânea de todas elas. Por hoje limitamo-nos a dos anjos rebeldes.

(BORDEAUX - MÉDIUM: SRA. CAZEMAJOUX)


Meus amigos, a teoria contida no resumo que acabais de ler é a mais lógica e mais racional. A sã razão não pode admitir a criação de Espíritos puros e perfeitos revoltando-se contra Deus e procurando igualá-lo em poder e grandeza.

Antes de atingir a perfeição, ignorante e fraco, o Espírito, entregue ao seu livre arbítrio, muitas vezes atira-se à corrupção e mergulha com prazer num oceano de iniquidades. Mas o que sobretudo causa a sua perda, é o orgulho. Ele nega Deus e atribui ao acaso a sua existência, as maravilhas da criação e a harmonia universal. Então, infeliz dele! É um anjo decaído. Em vez de avançar para mundos felizes, é até exilado do planeta que habita, indo expiar em mundos inferiores a sua incessante revolta contra Deus.

Irmãos, guardai-vos de imitá-los. Eles são os anjos perversos. Fazei todo esforço para não lhes aumentar o número. Que o facho da fé espírita vos esclareça quanto aos vossos deveres presentes e aos vossos interesses futuros, a fim de que possais um dia evitar a sorte dos Espíritos rebeldes e subir a escala espiritual que leva à perfeição.

Vossos Guias Espirituais.


(HAYA, HOLANDA ─ MÉDIUM: BARÃO DE KOCK)

Sobre esse artigo pouco terei que dizer, senão que ele tem a sublimidade da verdade. Nada tenho a acrescentar ou a subtrair. Felizes os que tiverem fé nessas belas palavras e que aceitarem esta doutrina escrita por Allan Kardec. Kardec é o homem escolhido por Deus para a instrução das criaturas no presente. São palavras inspiradas por Espíritos do bem, Espíritos muito superiores. Tende fé. Lede e estudai toda a doutrina: é um bom conselho que vos dou.

Vosso Guia Espiritual


(SENS ─ MÉDIUM: SR. PICHON)

P. ─ Que devemos pensar da interpretação da doutrina dos anjos decaídos que o Sr. Kardec publicou no último número da Revista Espírita?

R. ─ Que ela é perfeitamente racional e que nós mesmos não a teríamos explicado melhor.

ARAGO


(PARIS. COMUNICAÇÃO PARTICULAR ─ MÉDIUM: SRTA. ESTEFÂNIA)

Está bem explicado, mas é preciso ser franco: há uma coisa que me contraria. Por que falar desse dogma da Imaculada Conceição? Tivestes revelações concernentes à Mãe do Cristo? Deixai essas discussões à Igreja Católica. Lamento tanto mais essa comparação quanto mais os padres dirão e crerão que vós lhes quereis fazer a corte.

Um Espírito amigo sincero do médium e do diretor da Revista Espírita.


(LYON ─ MÉDIUM: SRA. BOUILLANT) Nós acreditávamos outrora que os anjos, depois de haverem morado no mais radioso dos mundos, se tinham revoltado contra Deus e merecido a expulsão do Éden, que Deus lhes havia dado para morada. Tínhamos cantado a sua queda e a sua fraqueza e, acreditando nessa fábula do Paraíso Perdido, o tínhamos ornado com todas as flores da retórica que conhecíamos. Era para nós um tema que oferecia um encanto especial. Esse primeiro homem e essa primeira mulher expulsos de seu oásis, condenados a viver na Terra e presas de todos os males que assediam a Humanidade, eram para o autor uma grande fonte para desenvolver as suas ideias, e o assunto se prestava sobretudo e perfeitamente às nossas ideias melancólicas.

Como os outros, havíamos acreditado no erro e havíamos juntado a nossa palavra a todas as demais que tinham sido proferidas. Mas agora que a nossa existência no espaço nos permitiu julgar as coisas do seu verdadeiro ponto de vista; agora que podemos compreender quanto era absurdo admitir que o Espírito, chegado ao seu mais alto grau de pureza, pudesse retrogradar de repente, revoltar-se contra o seu criador e com ele entrar em luta; agora que podemos julgar por quantos cadinhos o licor deve ser filtrado para se depurar, a ponto de se tornar essência e quintessência, estamos em estado de vos dizer o que são os anjos decaídos e o que deveis crer do Paraíso Perdido.

Em sua imutável lei do progresso, quer Deus que os homens avancem, avancem incessantemente, de século em século, em épocas por ele determinadas. Quando a maioria dos seres que habitam a Terra se torna muito superior à parte terrestre que ocupa, então Deus ordena uma migração de Espíritos, e os que realizaram sua missão com consciência vão habitar regiões que lhes são designadas, mas o Espírito recalcitrante ou preguiçoso, que vem manchar o quadro, é obrigado a ficar na retaguarda. Nessa depuração, ele é repelido, como fazem os químicos com as substâncias que não foram filtradas. Então o Espírito se acha em contato com outros que são inferiores e sofre realmente o constrangimento que lhe é imposto.

Ele se lembra intuitivamente da felicidade de que desfrutava e se acha em meio a seus iguais como flor exótica que tivesse sido de chofre transplantada para um terreno inculto. Tal Espírito se revolta ao compreender a sua superioridade e procura dominar os que o cercam. Essa revolta, essa luta contra si próprio, se transforma em luta contra o Criador que lhe deu vida, e que ele desconhece. Se seus pensamentos se puderem desenvolver, ele derramará o que extravasa do seu coração em recriminações amargas, como o condenado na sua prisão, e sofrerá cruelmente até que tenha expiado a preguiça e o egoísmo que o impediram de acompanhar os seus irmãos.

Eis, meus amigos, quem são os anjos decaídos e por que todos lamentam a perda de seu paraíso.

Procurai, pois, por vossa vez, apressar-vos para que não sejais abandonados quando soar o toque do retorno. Lembrai-vos de tudo o que deveis a vós mesmos. Dizei que vós sois vós e que tendes o vosso livre-arbítrio.

Essa personalidade do Espírito vos explica por que o filho de um cientista por vezes é um idiota e por que a inteligência não se pode transformar em morgadio. Um grande homem bem poderá dar à sua progênie o gabarito de sua figura, mas jamais lhe transmitirá o seu gênio. Podeis estar certos de que todos os gênios que vieram desenvolver os seus talentos entre vós eram filhos de suas próprias obras, porque, como disse um grande sábio: “É que as mães dos Patay, dos Letronne e do grande Arago criaram esses grandes homens muito inocentemente”. Não, meu amigo, a mãe que dá à luz um talento ilustre nada influi no Espírito que anima o seu filho. Esse Espírito já era muito adiantado quando veio reencarnar-se no cadinho da depuração.

Subi, pois, os degraus da escada, degraus luminosos e brilhantes como sóis, pois que Deus os ilumina com sua luz esplêndida, e lembrai-vos de que agora que conheceis o caminho, seríeis muito culpados se vos tornásseis anjos decaídos. Aliás, penso que ninguém ousaria lamentar-vos e cantar novamente para vós o Paraíso Perdido.



MILTON



(FRANCFORT ─ MÉDIUM: SRA. DELTON)

Nada direi sobre essa interpretação dos anjos rebeldes senão que ela faz parte dos ensinamentos que vos devem ser dados a fim de atribuir às coisas mal compreendidas o seu verdadeiro sentido.

Não creiais que o autor desse artigo haja escrito sem assistência, como ele próprio imaginou. Ele acreditou emitir as suas próprias opiniões, razão pela qual ficou desconfiado, ao passo que na realidade ele apenas deu forma às ideias que lhe eram inspiradas.

Sim, ele está certo quando diz que os anjos rebeldes ainda estão na Terra, e que são os materialistas e os ímpios, os que ousam negar o poder de Deus. Não está aí o cúmulo do orgulho? Vós todos que credes em Deus e lhe cantais louvores, vos indignais com tal audácia da criatura, e tendes razão. Sondai, entretanto, a vossa consciência e vede se a cada instante não vos revoltais contra ele, esquecendo as suas santas leis.

Praticais a humildade, vós que acreditais na superioridade do vosso mérito; vós que vos orgulhais pelos dons que haveis recebido; vós que encarais com ciúme e inveja a posição superior do vosso vizinho, os favores que lhe cabem e a autoridade que lhe é concedida?

Praticais a caridade, vós que denegris o vosso irmão; que derramais sobre ele maledicência e calúnia; que em vez de lançar um véu sobre os seus defeitos sentis prazer em exibi-los em público, para humilhá-lo?

Vós, que credes em Deus, sobretudo vós, espíritas, que assim agis, em verdade vos digo que sois mais culpados que o ateu e o materialista, porque tendes a luz e não vedes.

Sim, também sois anjos rebeldes, porque não obedeceis à lei de Deus. No grande dia Deus vos perguntará: Que fizestes dos meus ensinos?

PAULO, Espírito Protetor

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